Opinião

A Deriva Litoral – António Pedro Silva

O documentário”Deriva Litoral – O impacto da erosão costeira em Portugal”co-produzido e realizado pela Fábrica Centro Ciência Viva e pela Universidade de Aveiro, foi apresentado no CICLOne de Conferências – “Deriva Litoral”, organizado pela Associação Amigos do Cáster e que decorreu na passada sexta-feira (dia 24 de Março) no Posto de Turismo do Furadouro, Ovar.

Este tema foi conduzido de uma forma ligeiramente diferente do habitual. Sendo exibido o documentário “Deriva Litoral” de Sofia Barata, baseado em entrevistas a investigadores da Universidade de Aveiro, o qual reúne um vasto conjunto de imagens reais, locais e factos acompanhadas de explicações científicas. Posteriormente, à sua visualização, ocasionou-se um período de debate que contou com a presença de reconhecidos especialistas na matéria da erosão costeira, como o Prof. Doutor Carlos Coelho, o Prof. Doutor Paulo A. Silva, o Prof. Doutor Paulo Baganha Batista (ambos da Universidade de Aveiro), e ainda o Eng. Manuel Jardim (Câmara Municipal de Ovar).

Partindo do princípio que a população tem reflectido sobre as matérias tratadas, é de supor que, estejam habilitados a pensar sobre a questão da fragilidade dos litorais. Assim, o papel da Associação Amigos do Cáster foi o de suscitar, através deste documentário previamente escolhido, a discussão de temas como as fragilidades litorais versus ordenamento do litoral, a erosão costeira, o papel das obras de defesa e protecção costeira, as dunas e a protecção das praias, o (des)ordenamento versus educação ambiental, a poluição das praias e os POOCs (Planos de Ordenamento da Orla Costeira), que traduzem a consciência e sensibilização que a populaçãotem que adquirir acerca da dinâmica que perpassa nos litorais.

Tratou-se de uma análise dos agentes que estão na origem do problema e de um exercício de reflexão sobre soluções futuras. Por isso, a participação de especialistas foi fundamental para cumprir os objectivos de sensibilização e esclarecimento dos cidadãos, na formação das suas opiniões informadas.
Salienta-se a participação dos departamentos de Ambiente e Ordenamento, Engenharia Civil, Física e Geociências da Universidade de Aveiro e do Laboratório Associado Centro de Estudos do Ambiente e do Mar – CESAM.

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O espaço litoral português, continental e insular, concentra cerca de 75% da população portuguesa, sendo responsável pela produção de 85% do produto interno bruto. Nele se localizam as principais áreas urbanas e industriais, bem como as áreas de turismo intensivo, que alternam com áreas naturais, rurais e de pesca (INAG, 2009).

A ocupação crescente e a intensificação das malhas urbanas em zonas mais expostas à agitação marítima têm levado à implantação de estruturas de defesa costeira de modo a estabilizar a linha de costa. No entanto, estas estruturas são objecto de polémica uma vez que artificializam a paisagem e agravam ou antecipam fenómenos erosivos a sota mar.

A erosão costeira afecta as praias um pouco por todo o mundo e é responsável por danos em propriedades e infra-estruturas. A área de estudo em que me foco localiza-se na costa noroeste de Portugal sendo caracterizada por uma planície arenosa extensa de NW-SE, integrada num sistema de barreira-laguna (Aveiro). O presente trabalho expõe resultados recolhidos sobre o sector entre as praias de Maceda e S. Jacinto, expostos a um grande recuo da linha de costa na maioria da área de estudo, devido à redução no fornecimento de sedimentos e a condições de elevada agitação marítima.

As dificuldades inerentes ao tratamento das questões relacionadas com a orla costeira são variadas e imensas, para além de muitas incertezas associadas à aplicação de projecções ou cenários a situações concretas, por limitações das próprias metodologias e especificidades de cada situação. Os conceitos e teorias que têm como objectivo compreender os fenómenos costeiros são ainda de aplicação limitada.

Na análise das linhas de costa e projecções futuras, não é possível prever uma linha final como solução, mas possivelmente uma faixa provável para a sua localização. Perante este fato, será pouco lógico entrar com demasiados factores na definição da projecção da linha de costa, sendo mais importante a caracterização com rigor dos que são fundamentais nos fenómenos de evolução da linha de costa e adopção criteriosa das projecções.

Está demonstrado que a expansão urbana sem um ordenamento sustentável, os impactes de grandes obras aliadas ao somatório de vastas e as sucessivas intervenções antrópicas de pequena escala, podem induzir um progressivo desequilíbrio dos sistemas naturais. Pontualmente, os impactes de acções antrópicas tidas como indispensáveis, poderão ver-se diminuídas com soluções técnicas e economicamente viáveis, como por exemplo, utilizar os volumes de dragados das áreas portuárias, na alimentação de praias; transposição artificial das areias a barlamar dos molhes portuários para sotamar; recorrer à alimentação artificial para a recuperação de praias com elevado interesse turístico; evitar a construção de novas estruturas que interfiram com a deriva litoral e conservar e/ou reconstruir as frentes do cordão dunar frontal.
A progressiva erosão da costa encontra-se associada a um notório défice sedimentar no litoral. Esta situação resulta, em grande parte, das obras de regularização das bacias hidrográficas (principalmente do rio Douro e seus efluentes), geradoras de retenção de sedimentos nas barragens que, nas últimas décadas, reduziram a carga sólida que de outro modo chegaria até às praias. Evidencia-se que a modificação da dinâmica litoral imposta por estruturas antrópicas de protecção costeira (molhes e esporões) que, apesar de não alterar o défice sedimentar, cria irregularidades na distribuição de sedimentos.
No segmento costeiro Maceda – Furadouro a linha de costa tem recuado e continuará a recuar no futuro, sendo de ter em consideração, a breve trecho, que a existência da lixeira selada de Maceda pode tornar-se um perigo ambiental para a nossa região.
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Face aos problemas de erosão que as populações costeiras enfrentam, normalmente reivindica-se a construção de obras de protecção e defesa. Estas podem ser de diversos tipos:
•    Obras longitudinais aderentes (enrocamentos, paredões);
•    Obras longitudinais não aderentes (quebra-mares destacados);
•    Obras transversais (molhes, esporões).

Porém, ao perturbar o desenvolvimento normal da deriva litoral todas as obras transversais acabam por reter sedimentos a barlamar. Essa retenção de sedimentos vai provocar um deficit a sotamar, que resulta, normalmente, num recuo da linha de costa. Se houver valores patrimoniais importantes a defender é evidente que se vão construir novos esporões que vão exportar o problema para sotamar.
Na perspectiva de um intercâmbio dentro do sistema praia-duna, a existência de dunas funciona como um dos melhores elementos de defesa costeira. Porém, o uso balnear intensivo das praias acaba por destruir, devido ao pisoteio das dunas, a sua vegetação. O papel da vegetação é importante na resistência das dunas à erosão. As sendas formadas pelo pisoteio podem ser aproveitadas pelo vento para criar corredores de deflação.
A utilização intensiva das áreas litorais para fins turísticos deve obrigar a um processo de ordenamento que obedece a alguns princípios elementares.
•    As estradas litorais devem ser perpendiculares e não paralelas à linha de costa.
•    Os parques de estacionamento devem ficar situados atrás do cordão dunar e ter uma forma que conduza os utentes para a utilização de passadiços.
•    Os passadiços devem ser a única forma de transposição do cordão dunar. Este deve ser protegido através de sebes que dificultem o mais possível a passagem para as dunas.
Sabemos, porém que todas essas boas intenções esbarram na burocracia e na indefinição das opções políticas!

António Pedro Silva

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