Agricultores querem Marcelo a falar sobre a “ditadura” dos hipermercados
O dirigente da Confederação Nacional de Agricultura (CNA) João Dinis desafiou esta terça-feira o Presidente da República a pronunciar-se sobre aquilo que diz ser a “ditadura comercial” dos hipermercados que “impõem preços de arrasar à produção nacional”.
“O senhor Presidente da República faz questão de falar sobre muitos assuntos. Esperamos que não deixe de falar contra esta verdadeira ditadura monopolista das grandes superfícies comerciais, até porque é inconstitucional”, disse à Lusa João Dinis.
O dirigente da CNA falava em Estarreja, à margem de uma marcha lenta que juntou cerca de 40 tractores, para exigir melhores preços e o regresso das quotas leiteiras.
A luta contra “o abuso das marcas brancas e das promoções que esganam a produção nacional” é uma das reclamações dos produtores de leite e carne, sublinhou João Dinis, referindo que “uma vacaria com 50 vacas está a perder 3 mil euros por mês para continuar a produzir”.
O dirigente considerou ainda insuficientes os apoios ao sector leiteiro anunciados esta terça-feira pelo ministro da Agricultura, defendendo que é necessário repor “o mais rapidamente possível” as quotas leiteiras.
“Não basta, nem resolve os problemas injectar dinheiro, ainda que as ajudas sejam bem-vindas, ainda que as ajudas correspondam a reclamações nossas. Mas é necessário que seja reposto um sistema público de controlo da produção como foram as quotas leiteiras”, vincou.
Além da reposição das quotas leiteiras, o dirigente da CNA defendeu o aumento dos preços à produção, a redução dos custos de produção e a reposição do desconto à electricidade verde.
Em declarações à agência Lusa, o produtor de leite António Valente disse que só não fechou ainda as portas, porque tem compensado os prejuízos na produção de leite com a venda da carne.
“Neste mês, recebemos 25 cêntimos por cada litro de leite e há 30 anos estavam-nos a pagar por esse mesmo litro de leite 30 cêntimos. E há 30 anos um quilo de ração custava 22 cêntimos e hoje estamos a pagar essa ração a 41 cêntimos. É muito complicado a gente sobreviver a isto”, disse este detentor de uma exploração, com 115 animais.
António Valente admite que se a situação não melhorar brevemente também irá abandonar a actividade, tal como outros colegas. “Estão a fechar todos os dias explorações e vão continuar a fechar”, afirmou.
Maria Oliveira, que tem uma exploração com cerca de 40 animais, também já ponderou fechar as portas, mas ainda não o fez porque tem empréstimos para pagar relacionados com a sua actividade.
“Não se ganha para o que se gasta. É uma miséria e cada vez estamos pior. Com os produtos a aumentar e o leite a baixar, assim não vamos a lado nenhum”, disse esta produtora de leite citada pela Lusa.
Cerca de 40 tractores realizaram esta terça-feira uma marcha lenta entre Ovar e Estarreja, no distrito de Aveiro, exigindo medidas para proteger a produção nacional de leite e de carne.
Em Estarreja, os produtores realizaram um cadeado humano, em frente a um supermercado de uma multinacional alemã de retalho e dirigiram-se depois para a Câmara de Estarreja, onde foram recebidos pelo vice-presidente da autarquia, a quem entregaram um documento com as reclamações do sector.
O protesto surge depois de o Governo ter anunciado um novo conjunto de medidas de apoio para o sector do leite, que inclui o pagamento de um prémio suplementar de 45 euros por vaca a todos os produtores de leite do Continente, num montante global de 7 milhões de euros. A este montante junta-se o prémio anual, cujo valor médio é de 82 euros por vaca.
Depois, há lugar ao pagamento de um prémio extraordinário de mais 45 euros por vaca, acumulável com o anterior, atribuído às primeiras 20 vacas de cada exploração, aplicável a todos os produtores do território nacional, num montante global de cerca de 4 milhões de euros.