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Ciência das redes complexas auxilia no combate ao Covid-19

Coronavírus coloca desafios difíceis à ciência

A pandemia que estamos a atravessar reforçou a ideia que todos já tínhamos: o mundo é mesmo um lugar pequeno. Todos estamos ligados em várias redes e o Covid-19 trouxe mais uma que dispensávamos bem. Mas há mais, muito mais que o estudo das redes tem vindo a desvendar.

O estudo das redes é um recente campo de investigação da física que atravessa várias ciências. O ovarense, Fernando Mendes, investigador e professor na área dos sistemas complexos do Departamento de Física e do Instituto de Nanoestruturas, Nanomodelação e Nanofabricação (I3N) da Universidade de Aveiro (UA), destaca-se nesta área de investigação que, em poucos anos, se tornou num campo “quente” da Física.

“Por trás de tudo o que nós pensamos e lidamos está uma rede. O tópico tornou-se muito popular e interessante pelo facto de ter múltiplas aplicações”, explica o investigador, acrescentando que “são múltiplas as aplicações do conhecimento das redes e vão desde o estudo das redes sociais ao desenho de novos medicamentos”.

“No futuro, cada pessoa vai ter um medicamente para si e não uma aspirina para toda a gente. Espera-se que cada pessoa tenha um medicamento para o fígado diferente do da outra pessoa, embora seja a mesma doença. Espera-se que o estudo das redes biológicas [de cada indivíduo] possa dar um contributo nesse sentido, porque quando se toma um medicamento ele vai reagir quimicamente com um elemento. Isso vai quebrar uma ligação, eliminar um elemento na rede que não devia lá estar”, explica Mendes.

Há dias, Fernando Mendes escreveu nas redes sociais que o “a taxa de crescimento de infectados com o Coronavírus estava a diminuir e podia vir a ser nula ou perto disso em poucos dias”. No entanto, “o alargamento do número de testes e a própria dinâmica da propagação tem levado a que essa taxa se mantenha em torno dos 3%”, explicou-nos.

Por exemplo, “o que foi feito em Ovar foi muito importante, por causa do contágio às regiões vizinhas, mas internamente o isolamento também evitou o espalhamento interno…”

Mesmo em casa, o autor do ‘best seller’ “Evolution of Networks: from Biological Nets to the Internet and WWW”, editado em 2003, pela Universidade de Oxford, dedicado ao estudo das redes em geral, tem feito alguns estudos teóricos que, “em certa medida, se aplicam, mas é difícil fazer previsões, uma vez que os dados são poucos para a calibração dos modelos”.

Há alguma dificuldade no acesso aos dados reais, constata, pois, “de alguma forma, os casos que são detectados através dos testes ou por sintomas são isolados, mas o problema persiste porque muitos são assintomáticos que, ou estão no período de incubação mas estão a propagar o vírus”. “Isto embora as pessoas infectadas, colocadas em isolamento com outras medidas como higienizarão, distanciamento social façam com que a curva seja mais baixa mas também tende a ser mais duradoura no tempo”.

Eleito em 2019 ‘fellow’ da Sociedade Americana de Física, uma das mais prestigiadas associações mundiais ligadas à Física, Mendes é um dos sete investigadores envolvidos no projecto europeu DYSONET que pretende caracterizar quantitativamente as redes sociais complexas através da análise de dados concretos, como os comportamentos das multidões, técnicas de pesquisa, tráfego automóvel, dinâmicas das redes de relações humanas e o desenvolvimento de epidemias.

“Os modelos que usamos tem em consideração as redes sociais (contactos sociais entre pessoas) e o facto de estes não serem homogêneos, existirem pessoas que são hubs e, portanto, com grande potencial de espalhamento, esta heterogeneidade dos contactos sociais tem consequências importantes”, alerta o antigo vice-Reitor da UA.

A ciência das redes complexas está a ser usada por diferentes grupos em Itália e Espanha e está a ser feito muito trabalho, neste âmbito, nos Estados Unidos da América.

Mas estarão estes estudos a ser tidos em conta, por exemplo, no alívio das restrições e do confinamento? Fernando Mendes diz que ainda é cedo para saber, porque “diferentes países têm tido diferentes estratégias, como a Suécia ou a República Checa”.

O investigador vareiro pensa que “as instituições de saúde nos diferentes países têm gente que pode fazer este tipo de previsões, embora sempre com janelas de erro muito grandes.” Nos EUA, continua Fernando Mendes, “estão a fazer previsões sobre as necessidades hospitalares em termos de camas e de cuidados intensivos, mas com margens de erro muito grandes porque dependem muito dos comportamentos das pessoas.”

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