É necessário ajustar o esforço de pesca na Ria de Aveiro
Um estudo levado a efeito pelo IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera, no âmbito do projecto Gepeto, aconselha repensar a gestão dos recursos de pesca da Ria, num momento de crescente protesto por parte dos mariscadores devido à proibição da apanha de bivalves.
De entre as 4 principais espécies exploradas na Ria de Aveiro, o berbigão continua a ser o bivalve que apresenta uma maior abundância e área de distribuição, podendo ser capturado em todos os canais, cales e esteiros da laguna.
Esta foi uma das principais conclusões do estudo sobre a “Distribuição e abundância dos moluscos bivalves com maior interesse comercial na Ria de Aveiro”, levado a efeito por Francisco Maia e Miguel Gaspar, do IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera, no âmbito do projecto Gepeto e apresentado no início do mês de Julho, em Vigo.
O berbigão representou cerca de 75 % da biomassa total de bivalves capturados. No entanto, o estuda alerta para o facto dos bancos desta espécie serem constituídos por uma grande fracção de indivíduos subdimensionados (67,2%). As principais zonas de pesca situam-se nos bancos intermareais localizados no Canal de Mira, Cale da Moacha e Cale do Ouro. Estas três zonas de produção contribuíram com cerca de 70 % da biomassa total de berbigão capturado. Comparativamente a 2006/2007, observou-se uma redução acentuada quer da abundância (60,7 %) quer da biomassa (61.9 %) de berbigão em toda a região.
Relativamente à amêijoa-japónica, que representou cerca de 17 % das capturas totais, foi possível observar um padrão de distribuição pelas zonas com maior influência dulçaquícola localizadas a montante dos principais canais da Ria de Aveiro, nomeadamente pelo Canal de Ovar, Canal de Mira, Canal de Ílhavo e Canal Principal. Esta dispersão é notável quer pela rapidez quer pela eficácia com que colonizou novos habitats na laguna.
Em pouco mais de 2 anos, tornou-se na segunda espécie mais importante em termos comerciais da Ria de Aveiro. Os bancos de amêijoa-japónica são constituídos maioritariamente por exemplares adultos, com dimensões superiores ao tamanho mínimo de captura (40 mm).
À semelhança dos bancos de amêijoa-japónica, também os bancos de amêijoa-macha são constituídos por uma maior proporção de indivíduos com tamanho superior ao mínimo de captura (93.9 %). No entanto, continua o estudo, ao comparar estes resultados com os obtidos na campanha anterior (2006/2007), verifica-se uma redução drástica quer da abundância (80,7 %) quer da biomassa (92,8 %) total de amêijoa-macha capturada.
Os principais bancos, que se localizavam no Canal de Principal (perto da zona do Rebocho) e na zona Norte do Canal de Mira (entre o Porto de Pesca Costeira de Aveiro e o Navio-Museu Sto. André) pura e simplesmente desapareceram.
A amêijoa-boa
A amêijoa-boa continua a ser a espécie com menos representatividade nas capturas de bivalves na Ria de Aveiro. No âmbito deste projecto, foram apenas capturados 25 exemplares em toda a campanha de pesca. Os stocks desta espécie encontram-se praticamente esgotados. Quando comparados com os rendimentos obtidos nas campanhas anteriores observa-se uma diminuição de 67,0 % dos valores da biomassa e de 76,6 % da abundância.
“Tendo em consideração a situação actual em que se encontram estes recursos, em particular o berbigão, a amêijoa-macha e a amêijoa-boa, considera-se necessário ajustar o esforço de pesca”, aconselham os autores do estudo. Francisco Maia e Miguel Gaspar recomendam “a redução dos actuais limites de captura ou pelo menos a sua manutenção desde que acompanhada por um reforço e eficiência da fiscalização”. “Poderá ser necessário encontrar uma forma alternativa de gestão destes recursos que poderá passar pela criação de uma zona de interdição de pesca e de repovoamento artificial, cuja localização será acordada com os profissionais que se dedicam a esta actividade”, acrescentam.
No que diz respeito à amêijoa-japónica, o estudo não vê necessidade de diminuir os actuais limites máximos de captura, podendo os mesmos ser aumentados.
O que é o GEPETO?
O GEPETO é um projecto promovido pelos membros do Conselho Consultivo Regional das águas ocidentais do Sul (CCR Sul), com o objectivo de explorar a eficácia de novos modelos de gestão pesqueira enquadrados nos desafios de sustentabilidade que a nova Política Comum das Pescas propõe.
Os desafios que os parceiros do Projecto GEPETO tiveram de enfrentar foram de conseguir obter um roteiro comum e emitir propostas para implementar planos de gestão a longo prazo, desenvolver um modelo de governação comum que optimizasse o trabalho de colaboração entre as partes envolvidas; recolher as propostas para o futuro dos profissionais ou elaborar um Atlas da Pesca. Tudo isto, com vista a aumentar os conhecimentos acerca das pescarias, não só com dados, mas também com os conhecimentos e know-how dos profissionais e opiniões de todos os interessados (cientistas, administrações, sector da pesca e ONGs).
Para responder aos desafios do Projecto, foram seleccionados sete casos de estudo representativos de algumas pescarias em que participam as frotas de Espanha, França, Portugal e Irlanda, apresentados em Vigo, no passado dias 8 e 9 de Julho. Com as pescarias seleccionadas, trabalhou-se segundo uma metodologia comum, de modo a que, no futuro, esse trabalho pudesse servir para o desenvolvimento da gestão de outras pescarias.
Durante o tempo que durou o projecto, os parceiros que participaram (CETMAR, CCR-Sul, IFREMER, AZTI-Tecnalia, IPMA, IEO, Marine Institute e CC-ANOC) geraram imensos relatórios.