Manuel Ferreira: “Arada devia apostar no atletismo de formação”
Com 47 anos (faz 48 em Novembro próximo), Manuel Ferreira continua a coleccionar medalhas. Perde-se a conta às taças, troféus, medalhas e condecorações guardadas no minimuseu que tem em sua casa em Arada, no concelho de Ovar.
Entre os títulos mais recentes, contam-se três medalhas de prata conquistadas nas provas de Cross, 1000 metros e Meia Maratona disputadas no World Master Athletic – Campeonato do Mundo de Veteranos que decorreu em Porto Alegre, no Brasil, em 2013.
Um ano depois, lá estava ele, de novo no pódio de uma grande competição internacional para veteranos. Em Izmir, na Turquia, conquista duas medalhas de ouro para Portugal, nos 5.000 e 10.000 metros. E, este ano, entre 8 e 16 de Agosto, nos Campeonatos do Mundo para Veteranos que decorreram em Lyon, França, Manuel Ferreira juntou mais quatro medalhas – duas de bronze e duas de prata, à sua colecção: Um segundo lugar na prova da Meia Maratona, outro segundo lugar por equipas na prova de Cross, um terceiro lugar nos 10.000 metros e outro terceiro lugar no Cross Individual.
Manuel Ferreira tem aquilo que poucos atletas, em Portugal, sabem o que é: O vício de ganhar medalhas. Estas últimas são internacionais e estão mais frescas na memória, mas em sua casa moram muitas conquistas que por não caberem todas num sítio, estão espalhadas por vários compartimentos. Há muitas , de facto, mas há uma taça pequenina pela qual Manuel Ferreira nutre um carinho especial. “Foi a minha primeira vitória, tinha eu 11 anos. Fui campeão regional de infantis de Aveiro. O aradense lembra-se perfeitamente: “Foi ganha numa prova disputada nos terrenos onde hoje se encontra o Forum Aveiro”. Ganhar, para Manuel Ferreira é, portanto, um hábito antigo.
“É preciso muito treino e muito sacrifício”, porque não sendo profissional, uma medalha ou uma uma taça adquirem um valor especial. Funcionário da Yazaki Saltano, em Ovar, o atleta não tem mais palavras para agradecer todo o apoio que a empresa multinacional nipónica lhe tem concedido. “Patrocinou, inclusivamente, a minha viagem ao Brasil, para poder participar nos campeonatos de 2013”. Outros apoios e agradecimentos são extensivos à Câmara Municipal e à União das Freguesias de Ovar.
Os títulos e as medalhas são todos muito bonitos, são prestigiantes, ficam bem na decoração, mas Manuel Ferreira diz que isso não valia nada se não fosse o apoio da esposa e das filhas. “Elas estão lá nos momentos difíceis, acompanham-me sempre, dão-me sempre força e nada conseguiria se não fossem elas”. Os amigos também não são esquecidos. “Depois do Mundial, quando cheguei a Ovar, num dia à uma da manhã, eles estavam à minha espera. Isso é amizade sincera e verdadeira. Agradeço-lhes muito todos os sacrifícios que fazem por mim”.
Manter a forma para chegar às provas e poder disputá-las é, pois, essencial. “Trabalho por turnos rotativos e tenho que ter muito cuidado para não entrar em fadiga”, acrescentando que o descanso é muito importante. “Dormir de dia não é a mesma coisa, mas mesmo que não esteja a dormir, tento manter-me na cama sempre cerca de oito horas”. É muito importante conciliar treino, descanso e alimentação. Nada de exageros. “Não digo que não bebo um copo. Mas quando começa a competição, fujo disso tudo”, anota.
Os treinos decorrem, normalmente, nas imediações de sua casa, na floresta. “A geografia é plana, as condições não são más”. Manuel Ferreira lamenta, no entanto, que em Arada não exista uma pista consentânea com o sucesso de tantos atletas dedicados ao atletismo. “Parece que agora vai haver uma quando instalarem o relvado sintético no campo de futebol“, adianta.
Lamenta também “que não haja um clube, de tantos que há em Arada, que não se dedique a aproveitar todos estes talentos que despontam para o atletismo”. Manuel Ferreira não esconde que os seus êxitos contribuem para a promoção da modalidade e isso poderia ser aproveitado. “Há muita matéria-prima em Arada que só precisava de ser aproveitada. É pena que nenhuma colectividade aposte no atletismo”, lamentando que “Arada seja uma freguesia de gente bairrista” que, incompreensivelmente, não se dedica ao atletismo que tantas glórias e reconhecimento lhe tem trazido. E vem a propósito lembrar António Godinho, maratonista aradense que, em 1990, já com 34 anos, venceu a Maratona de Lisboa, de forma surpreendente. “Foi ele quem me incentivou a enveredar pelo atletismo”, recorda. “Hoje, somos grandes a amigos e até treinamos juntos”.
A carreira de treinador de atletismo pode ser um caminho a seguir para mudar o cenário. Mas a experiência aconselha prudência a Manuel Ferreira. “Pode ser que haja um clube que crie uma secção de atletismo, queira apostar na formação de atletas e me venha convidar. Nunca se sabe”.
Os Campeonatos do Mundo para Veteranos que terminaram este mês em Lyon foram, nas palavras de Manuel Ferreira, “um dos mais fortes e concorridos de sempre”. No seu caso, por exemplo, “o colega argentino que me ganhou na meia-maratona não passou do sexto lugar nos 10 mil metros”. Mas o episódio que o marcou e vinca a magia desta competição foi a corrida dos 200 metros para atletas com mais de 90 anos, que foi preciso decidir no photo-finish.”
É ainda curioso verificar que Manuel Ferreira, apesar dos êxitos, sempre correu por clubes mais ou menos modestos. Chegou a correr pelo Boavista entre as épocas de 1993 e de 2003. Hoje, enverga as cores do modesto Grupo Desportivo e Cultural de Guilhovai, clube de São João de Ovar.
Objectivo: campeão
Manuel Ferreira não esconde a ambição dos últimos campeonatos disputados em França. “Fui de prova em prova com a ideia de ser campeão do Mundo”, confessa ao Diário de Aveiro. “Infelizmente, não consegui, houve sempre um colega que foi melhor do que eu”.
Mas mesmo assim, competir em quatro provas e em todas elas ir ao pódio é obra. Manuel concorda e ainda reforça que esteve para se vir embora antes do previsto. “Depois da primeira prova, senti muitas dificuldades físicas e o que me valei foi o tratamento a que me sujeitei e que resultou”. “Caso contrário, ter-me-ia vindo embora”.