Opinião

Não desistas c…! – Henrique Gomes

Sabíamos que o atraso seria gigantesco quando ele voltasse a passar por nós, desta vez no Tourmalet- já o tínhamos visto em sofrimento lá para os lados de Bagneres de Bigorne, demasiado cedo na etapa para ser ignorada a debilidade demonstrada . Que o Rui não estava bem,era sabido, mas vê-lo assim em tamanho sofrimento era algo que nos fazia quase chorar.

Em Bagneres de Bigorne foi a primeira vez que vimos o Rui nesta etapa, já que falhámos a abordagem na partida de Pau. O autocarro da Lampre estava longe das barreiras e desta vez não conseguimos fintar a segurança, invadindo a zona reservada. O truque é sempre o mesmo: saltar as barreiras por entre os autocarros quando os polícias estão de costas e correr para junto dos ciclistas pretendidos. A posterior mistura com o pessoal autorizado a estar na zona reservada, serve-nos de protecção.

Depois é o cerimonial habitual- esperar que os ciclistas saiam dos autocarros para a saudação, fotografia e autógrafo nas camisolas feitas a propósito.
O Rui e os outros ciclistas portugueses que participam no Tour, sempre se mostraram disponíveis para esse cerimonial todo, apesar do enorme stress pré partida de etapa.
Em virtude da nossa falta de ousadia na partida de Pau, o primeiro contacto visual com o Rui só surgiu em Bagneres de Bigorne. Aí, o ciclista português seguia isolado, mas na parte final do pelotão e com um esgar de sofrimento .

Apercebendo-me das dificuldades do ciclista, solto no meu melhor estilo vernáculo a frase que pensei ser motivadora para o Rui:
– Não desistas caralho!
Não sei se ele ouviu ou ligou alguma coisa. Não sei se sentiu ofendido pela falta de qualidade do meu discurso. Sei que, consequência dos meus saltos e dos meus berros, meia dúzia de franceses foram ver o que restava passar da caravana, para outro lugar.
Agora no Tourmalet, e depois de há muito terem passado grande parte dos ciclistas e da caravana, surge por fim o Rui. Consigo traz ,para além de um ciclista da Astana na sua roda, um enorme sofrimento e um agitar desmesurado em cima da bicicleta.
– Não desistas caralho!

De novo , lanço a mesma frase em direcção ao ciclista. De novo , com os meus berros e saltos, consigo afastar outra pequena multidão de franceses que estavam perto de mim, mas desta vez consigo ouvir os seus comentários , em relação a mim:
– Quand meme, ll faut pas engueuler le cycliste!
Logo após ter passado por mim e pelo Anselmo, metros à frente, o Rui acabaria por desistir, pondo termo ao seu Tour e ao seu sofrimento. A notícia chega em formato digital e é algo que ninguém queria ouvir e que nos deixa desolados.

O ciclista terá feito tudo para poder continuar em prova, mas o seu esforço e profissionalismo não foram suficientes para ultrapassar tanta adversidade. Talvez o nosso desgosto seja residual comparativamente ao do Rui.

Henrique Gomes (a acompanhar o Tour’15)

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