Opinião

Nova Vida para os Devolutos – Por Diogo Fernandes Sousa

 

A realidade dos edifícios devolutos, sobretudo em meio urbano consolidado, revela-se um desperdício material e um sinal de falência funcional do modelo de planeamento e gestão urbana. Perante esta inércia acumulada, é dever do governo reafirmar a autoridade do estado, promovendo a reconversão estratégica de imóveis devolutos em resposta às necessidades habitacionais.

A inação perante edifícios devolutos, públicos e privados, traduz-se em vários planos de custo social, económico, urbanístico e ambiental. São imóveis frequentemente localizados em áreas infraestruturadas, servidas por transportes públicos, mas que permanecem inativos, degradando o espaço urbano, alimentando a insegurança e contribuindo para a especulação fundiária.

Ao mesmo tempo, a escassez de oferta acessível tem vindo a comprometer o direito à habitação consagrado constitucionalmente, nomeadamente para os mais jovens. Esta disfunção agrava desigualdades sociais e territoriais, tornando inadiável uma resposta coordenada do estado.

Assim, proponho uma abordagem multidimensional, ancorada em cinco eixos de intervenção: mapeamento e cadastro dinâmico do património devoluto com um sistema nacional integrado de georreferenciação dos edifícios devolutos, cruzando dados das câmaras municipais, da administração central e da autoridade tributária; mobilização do património público inativo que deve ser prioritariamente reconvertidos em habitação acessível, com recurso a parcerias público-privadas, modelos cooperativos e mecanismos de arrendamento acessível; instrumentos legais para induzir a reabilitação no setor privado com possíveis penalizações fiscais acrescidas, mas também o alargamento dos poderes municipais de tomada administrativa temporária para reabilitação com fins habitacionais; integração com políticas de coesão territorial, em vilas e cidades médias, avançando com a reconversão inteligente desses espaços, associada a incentivos à fixação de população e ao teletrabalho para mitigar assimetrias regionais; simplificação procedimental e incentivos ao investimento ético através da agilização de processos de licenciamento, revisão das normas urbanísticas desadequadas e garantia de apoio técnico-financeiro à pequena reabilitação.

A autoridade do estado mede-se, também, pela sua capacidade de agir com eficácia e equidade. Permitir que milhares de imóveis permaneçam ao abandono, num contexto de carência habitacional, é um erro de planeamento. A reconversão dos edifícios devolutos deve, por isso, ser transversal às políticas de habitação, coesão, finanças e ambiente.

Diogo Fernandes Sousa

Escritor do Livro “Rumo da Nação: Reflexões sobre a Portugalidade”

Professor do Instituto Politécnico Jean Piaget de Vila Nova de Gaia

 

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