A SIC e o candidato de sempre: um mau serviço à democracia

O problema não é dar espaço ao candidato A ou B. O problema é a repetição mecânica de um erro que já tem histórico: oferecer palco prioritário a quem, eleição após eleição, surge com grande exposição inicial… e desaparece antes de o processo atingir maturidade pública.
Enquanto a esmagadora maioria dos outros candidatos — quinze, vinte, tantas vezes invisíveis, ainda está a ser formalizada, ainda não se sabe se desistem ou se avançam com seriedade, a SIC decide projetar primeiro aquele cujo passado mediático revela precisamente o oposto de consistência. Não há aqui mérito noticioso. Há apenas um reflexo editorial fácil, preguiçoso e profundamente injusto: reciclar a mesma figura, ignorando quem tenta realmente entrar no debate democrático.
O resultado é sempre o mesmo. Ao abrir os telejornais com a candidatura de Manuel Vieira, o canal de Carnaxide apresenta-o como figura relevante e transforma todos os restantes em figurantes. Faz parecer que o processo eleitoral é uma anedota, uma feira de curiosidades, em vez de uma oportunidade cívica séria. A própria ordem da informação cria hierarquias artificiais — e isso tende a achincalhar quem está agora a começar o percurso e merece ser colocado em pé de igualdade.
Mais grave do que a escolha é a consequência: a SIC contribui para banalizar a pluralidade democrática. O eleitorado fica com a sensação de que há um “candidato folclórico de serviço”, e que todos os outros pertencem à mesma categoria, mesmo quando muitos são estreantes com propostas válidas, projetos genuínos e vontade de debater o país.
Em vez de servir a democracia, a SIC presta-lhe um triste favor. Em vez de informar, condiciona. Em vez de ampliar a participação, produz ruído. E tudo isto quando já sabe, por histórico e por evidência, que Manuel Vieira tende a desaparecer do processo antes da linha de partida real. É difícil compreender como um canal que se diz comprometido com informação rigorosa insiste em repetir um padrão tão contraproducente.
A democracia não pede que se dê cinco minutos a todos. Pede apenas que o jornalismo não transforme o espaço público num circo recorrente. Mais respeito pelo eleitor, mais equidade entre candidaturas, e menos repetição automática de rostos cujo principal contributo tem sido a distração mediática. Já basta.
Paulo Freitas do Amaral, Professor, Historiador e Autor





