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Fernando Dacosta em noite recheada de memórias

Romancista, dramaturgo, conferencista e jornalista, Fernando Dacosta, nascido em Angola em 1945, foi o convidado do “À Palavra”, no Museu de Ovar, que se realizou no sábado (dia 8).

A tradição das tertúlias foi mesmo uma dica a que Dacosta deu atenção na fase inicial da conversa que se veio a estender ao estado actual da imprensa e do seu papel ao serviço dos grandes interesses económicos. Uma crítica acutilante vinda do profissional com uma longa carreira como jornalista, que trabalhou em jornais e revistas como a Flama, Comércio do Funchal, Vida Mundial, Diário de Lisboa, Diário de Notícias, A Luta, JL, O Jornal, Público ou Visão.

A situação do país, da Europa e do Mundo, nomeadamente, as políticas de austeridade e o poder dos mercados, com um rasto de pobres e desempregados, em contraste com a acumulação de riqueza nos ‘offshores’, mereceram particular nota do orador, que deixou alertas para a capacidade da paciência da população mesmo em nome de democracias, quando “vivemos em fascismos disfarçados de democracia”, afirmou, defendendo que o futuro deve passar por uma “aposta na solidariedade humana.

Caso contrário, “isto um dia rebenta”, porque acredita que “o povo um dia vai reagir, apesar das almofadas que se vão criando”, referindo-se aos apoios sociais. Fernando Dacosta falou também de um tempo em que, como repórter da Europa-Press, esteve destacado na Assembleia Nacional e no Palácio de São Bento, o que lhe permitiu conhecer pessoalmente António Oliveira Salazar
e o interior de um regime, ao longo da sua evolução, até Marcelo Caetano, e ao seu derrube pelo 25 de Abril. Uma abordagem de muitos episódios, alguns contados com alguma ironia por quem viveu de perto com vários protagonistas, quer do Estado Novo, quer da Oposição, incluindo a sua relação com José Saramago e a deste com o PCP, do qual guardas segredos que se comprometeu perante o Prémio Nobel a não partilhar mesmo depois da sua morte.

Foi uma noite recheada de memórias, que prenderam a atenção e entusiasmo dos leitores participantes no evento literário que se prolongou na noite, em que ainda houve tempo tempo para o escritor partilhar com os presentes, histórias do seu mais recente livro, “Viagens Pagãs”, sobre o qual o anfitrião Carlos Nuno Granja introduziu alguns apontamentos para logo a seguir Dacosta animar a tertúlia com momentos insólitos e divertidos.

Acabou a falar da sua relação com Agustina Bessa-Luís, Amália Rodrigues ou Natália Correia e o seu Botequim, um bar no largo da Graça, em Lisboa, que o autor se baseou para “O Botequim da Liberdade”, publicado em 2013. Um espaço de tertúlias que recebia algumas das maiores figuras da cultura portuguesa ou da politica, já que como referiu, lá se “formaram e derrubaram governos” em democracia, lembrou o autor de uma obra de cunho histórico e sociológico, que se centra no fim do Império Português e na preservação da memória do período pré-25 de Abril de 1974, que se reflectem nos seus livros, “O Viúvo”, “Máscaras de Salazar” ou “Os Mal-Amados”, entre várias das obras na sua longa carreira frequentemente premiada.

Esta foi mais uma noite para pensar, com um escritor para quem “a escrita é o último baluarte de resistência” a tanto “silêncio” que admitiu existir de forma inquietante.

José Lopes

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