Opinião

O dragão na loja da esquina – Por Anna Kosmider Leal

Somos todos diferentes, temos empregos que exigem diversificadas competências, temos preferências distintas, estilos de vida e escolhas pessoais únicas. Todavia nesta diversidade existe uma semelhança ou denominador em comum, a rotina diária. Esta desde vários seculos consiste em trabalhar, executar tarefas domésticas e lidar com os problemas da vida quotidiana, como a saúde, finanças ou outros contratempos. Mas o ser humano é fantástico e tem encontrado uma excelente almofada para aliviar a cabeça preocupada: o imaginário.

O imaginário tem ajudado a escapar dos problemas há seculos. Quem de nós não conhece mitos ou lendas?

A mitologia é o estudo dos mitos e a sua interpretação dentro de uma determinada cultura. Os mitos são histórias populares ou religiosas complexas, com vários pontos-de-vista, das pessoas que viviam na época em que os mitos foram criados. Normalmente é uma narrativa, na qual se usa a linguagem simbólica, e que busca retratar e descrever a origem e suposições de alguma cultura, explicar a criação do mundo, do universo, ou qualquer assunto de difícil explicação.

Os mitos geralmente retratam o mundo como ele era antes de o conhecermos. O tempo, o lugar e os personagens sobrenaturais e divindades fizeram com que muitos mitos tivessem um cunho religioso, sendo que em algumas religiões restam alguns resquícios mitológicos.

Atualmente, fala-se de uma Mitologia Moderna, advinda de lendas urbanas e de várias outras fontes. Exemplos claros são alguns desenhos animados e séries de televisão, que trazem inclusive personagens que defendem deuses. Os Cavaleiros do Zodíaco, por exemplo, são baseados em algumas mitologias, como a Grega, a Egípcia e a Nórdica. Considerando, portanto, que a mitologia é um conjunto de lendas e mitos de alguma cultura, pode-se dizer que existem inúmeras mitologias, dos mais variados locais, como as Mitologias: Azteca, Maia, Etrusca, Eslava, Ioruba, Babilônica, Africana, Bantu, Chinesa, Japonesa, Havaiana, Guarani, Malaia, Navajo, Suméria, Judaica, Islâmica, Inca, entre outras. O mito surge a partir da necessidade de explicação da origem e da forma das coisas, das suas funções e finalidade, dos poderes do divino sobre a natureza e os homens. Ele vem em forma de narrativa, criada por um narrador que possua credibilidade diante da sociedade, poder de liderança e domínio de linguagem convincente, e que, acima de tudo, imponha o que gostaria de impor adequando a estrutura do mito de uma forma que tranquilize os ânimos e responda às necessidades do coletivo.

É o narrador quem constrói o esquema do mito, porém ele só nasce e se consolida a partir da aceitação coletiva, ou seja, o mito só existe quando ele cai no senso-comum.

As lendas são histórias que podem incluir elementos fantásticos ou sobre-humanos, mas presume-se que tenham base em fatos históricos e mencionem pessoas ou eventos reais.

Um fato histórico transforma-se numa lenda quando a verdade é exagerada, dando características especiais às pessoas ou fantasiando acontecimentos. Por exemplo, nelas, as figuras históricas podem ter qualidades sobre-humanas ou extraordinárias.

Além disso, eventos reais podem incorporar elementos falsos, como um sábio ou cartomante avisando um herói sobre eventos futuros.

Apesar das características das pessoas, particularmente dos heróis, não poderem ser provadas ou serem mesmo falsas, as lendas ainda têm alguma base na verdade. Mas quem precisa de provas quando o Robin dos Bosques ajuda os pobres roubando os ricos ou quando o Galo de Barcelos faz justiça na mesa do juiz?

Hoje em dia o imaginário ganhou outras dimensões pois surgiram séries de fantasia como “A Guerra dos Tronos” ou “Harry Potter” cuja audiência em grande parte é adulta. É muito satisfatório acreditar que mesmo numa situação sem saída aparece uma rainha Daenerys Targaryen no seu dragão e vai salvar o mundo. O Zé Povinho aprecia também os pormenores de vida da família real britânica (por exemplo), o que é perfeitamente compreensível pois nas nossas idas à loja da esquina não é provável que encontremos o brilho das coroas e tradições reais. Adoramos nos mascarar no Carnaval e, mesmo que só por alguns instantes, sentirmo-nos como o pirata Jack Sparrow ou a Cinderela num baile antes da meia-noite.

Precisamos de explicar o inexplicável e se não der, entra o imaginário. O imaginário é o nosso amigo invisível que torna a realidade mais suportável.

O imaginário é uma espécie de esperança e pela esperança vale sempre a pena lutar.

Anna Kosmider Leal (Antropóloga)

 

 

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