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Bandopipo — Da Aduela ao Brinde: quando a cultura também se prescreve

A Escola de Artes e Ofícios de Ovar acolhe, de 15 de outubro a 31 de dezembro de 2025, a exposição “Bandopipo: Da Aduela ao Brinde”.

É uma mostra fotográfica com instalação multissensorial que cruza a tanoaria e a música, com 20 imagens de Mário Lisboa, videoarte de Carla Varanda, a presença física do instrumento Bandopipo e a audição da “Suite Bandopipo – Da Aduela ao Brinde”.

Horários: segunda a sexta,
10h00–12h30 e 14h00–17h00.

Mais informação:
https://obesmoriz.wordpress.com/exposicao/

Exposição e saúde pública: factos e prática
Escrevo este artigo não apenas como cocurador do projeto, mas como médico de família. Acredito na prescrição social e cultural como parte do cuidado em saúde: orientar pessoas para atividades culturais — participar ativamente ou simplesmente observar — melhora bem-estar e, em muitos casos, saúde mental. A evidência
acumulada é clara: maior energia e vitalidade, melhor autoestima, melhor relação com
os outros, aumento da motivação e do autocuidado, entre outros resultados documentados. Estes ganhos não se restringem a quem “faz”; também quem ouve, vê
e frui beneficia, sobretudo quando a experiência é regular e integrada na vida quotidiana.

No Alentejo Central, um projeto-piloto de prescrição cultural sistematizou um percurso operacional: referenciação, prescrição pelo médico de família, abordagem motivacional por um interlocutor local, encaminhamento para agentes culturais e avaliação. O manual do projeto descreve critérios de elegibilidade (isolamento social, ansiedade/depressão ligeiras a moderadas, desemprego, hiperfrequentação de consultas, polimedicação, entre outros), sublinha o papel dos cuidados de saúde primários e destaca que tanto atividades observacionais (visitar uma exposição, assistir a um concerto) como de participação ativa (workshops, clubes, grupos artísticos) têm impacto positivo quando regulares e adequadas ao perfil do participante.

Porquê o Bandopipo como “prescrição cultural”?
Porque é concreto, local e acessível. A exposição liga indústria tradicional (tanoaria) e
criação musical contemporânea. Mostra o Bandopipo — instrumento híbrido
conceptualizado por mim e construído pelo luthier Agostinho Rodrigues — e documenta como a música “estagia” com o vinho, materializando uma narrativa que é património, arte e ciência de materiais. É um ponto de entrada claro para a fruição cultural em Ovar: sem barreiras técnicas, com horários fixos e conteúdos que apelam a diferentes idades. Orquestra de Bandolins de Esmoriz

Como transformar esta visita em cuidado
Objetivo: usar a exposição para (re)ligar-se às raízes de Esmoriz e Ovar, contactar
om a inovação, fruir música e vídeo, e desencadear sensações que promovem bem-
estar — sozinho ou em boa companhia.
1. Raízes do concelho: Pare diante das fotografias procure ligações pessoais: memórias de família, ofícios, lugares. Faça perguntas simples: “O que daqui reconheço?” e “O que
quero voltar a ver melhor?”
2. Inovação que aproxima: Observe o Bandopipo como objeto novo nascido de saberes antigos. Note materiais, forma e função. Depois, veja a videoarte: identifique um pormenor
técnico e um pormenor poético.
3. Música e vídeo que ativam o corpo e a memória: Escute a “Suite Bandopipo – Da Aduela ao Brinde” com atenção focal. Note sensações físicas (respiração, tensão/descontração), imagens mentais e
emoções despertadas.
4. Prescrição relacional: vá acompanhado.
Convide 1–2 pessoas amigas a visitar consigo. A presença de outros potencia a experiência e combate o isolamento. No final, conversem sobre o que cada um sentiu e o que gostaria de ver/ouvir a seguir.
5. Depois da rotina: continue a procurar cultura — em Ovar e fora.
Use a exposição como âncora e, a partir daí, construa um mapa pessoal de cultura (lugares, horários, pessoas com quem ir). Replique o ciclo a cada 2–3 meses, variando formatos.

Convite!!!
Como médico de família e como cocriador do Bandopipo, convido todos — profissionais de saúde, decisores locais e cidadãos — a uma imersão neste projeto cultural. A cultura não substitui terapêuticas clínicas quando necessárias, mas complementa e, muitas vezes, previne: reduz sintomas ansiosos e depressivos
ligeiros, combate o isolamento e melhora a qualidade de vida.


O Manual de Prescrição Cultural do Alentejo Central (2022) descreve o processo e a evidência que sustentam estas afirmações. Recomendo a sua leitura como referência
operacional para replicação responsável em Ovar.
Venham ver como o vinho estagia como música!
Como cultura é também saúde!

Eurico Silva
Médico de Família — defensor da prescrição social e cultural; cocriador do Bandopipo

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