Opinião

A Praça das Galinhas (II) – Por Edgar Branco

Há muitos, muitos anos, esta praça não era uma praça. Era apenas um largo escondido entre os becos de Ovar, um espaço quase esquecido, cercado por muros e casas antigas, uma área sombria que poucos ousavam mencionar.

Mas a cidade guardava um segredo.

Naquele tempo, bem antes de a praça ganhar o nome que tem hoje, o Largo Mal Fadado era palco de um dos espetáculos mais controversos da região. Ali aconteciam as temidas Lutas de Galos.

O espaço era frequentado por figuras menos recomendáveis, homens de rostos endurecidos pela vida, marinheiros que regressavam sem glória, comerciantes falidos, malandros sem ocupação fixa. Ao cair da noite, estes homens juntavam-se para o único entretenimento que restava numa era sem televisões: o combate brutal entre galos de luta.

O recinto era um coliseu em miniatura, uma arena de madeira maciça, erguida com perícia pelos melhores carpinteiros da cidade. Cada arco era tallhado à mão, adornado com símbolos esculpidos que representavam a violência e a glória. O cheiro da serradura misturava-se com o do sangue e do suor, enquanto a multidão vibrava em êxtase, ansiando pelo derramamento da primeira gota.

Naquela noite em particular, o duelo mais aguardado de todos estava prestes a acontecer: O Galo Alvinegro contra o Galo Coque Sportif.

Dois campeões. Dois guerreiros. Duas lendas vivas.

O Galo Alvinegro era o orgulho dos Vareiros. Forte como um touro, negro e branco como as cores da cidade, um gladiador robusto, marcado pelas cicatrizes das batalhas passadas. Alimentado a milho de alta qualidade, nutrido com a melhor ração, tratavam-no como um atleta de elite, um combatente destinado à imortalidade.

Já o Galo Coque Sportif era um estranho em terras vareiras, um galo gaulês, criado noutras paragens. Diziam que vinha de terras nobres, onde os galos não eram apenas animais, mas símbolos de poder.

Tinha um corpo ágil, uma musculatura refinada e movia-se com a leveza de um dançarino e a ferocidade de um espadachim. Enquanto o Galo Alvinegro era um titã, o Coque Sportif era um duelista astuto, um galo cuja velocidade podia ser mais letal do que a força bruta do seu adversário.

Na cidade, não se falava de outra coisa.

— Venham todos! Venham todos! — gritavam os apostadores. — Hoje será o maior espetáculo já visto! Dois campeões vão se enfrentar! Duas forças da natureza! A vitória trará glória eterna! Quem sairá vencedor? Quem cairá derrotado?

A multidão rugia.

Os tambores começaram a soar.

A arena vibrava com a antecipação.

As portas das jaulas rangiam lentamente.

Os dois gladiadores estavam prestes a enfrentar o destino.

Artur, com os olhos arregalados, absorve cada palavra como se estivesse a ver tudo com os próprios olhos. (Continua)

Edgar Branco

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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