Modernidade não é “tabula rasa” – Por Arq.ª Diana Novo

Escrevo como cidadã e como arquiteta, com o compromisso de quem acredita que a arquitetura deve servir as pessoas e a memória coletiva.
O conjunto da Igreja, do Mercado e do Cineteatro sempre foi um ponto-chave da malha urbana de Ovar.
Ali cruzavam-se usos, histórias e símbolos que davam sentido ao espaço público.
A ligação ao Parque Urbano poderia ter sido a oportunidade perfeita para reforçar essa continuidade, costurando passado e futuro num só gesto.
O caminho escolhido, porém, traduz-se numa demolição total e numa praça mineral, fria, pensada para a exceção e não para o quotidiano.
Ao apagar um edifício com significado, não só perdemos memória, como também a possibilidade de criar uma praça viva, verde, humana e verdadeiramente democrática.
Um espaço público não deve ser apenas palco de eventos, mas infraestrutura de vida: sombra, conforto, encontros diários, pertença…
Modernidade não é tabula rasa. Modernidade é saber reinterpretar, integrar e transformar.
É cruzar disciplinas como a arquitetura, a engenharia, o urbanismo, a paisagem, o património, a mobilidade, o ambiente… para criar uma cidade que respeita quem somos e projeta quem queremos ser.
Ovar merece mais… Merece uma visão capaz de unir memória e futuro, forma e vida, estratégia e sensibilidade. Porque construir sem identidade não é progresso, é perda!
Quero ainda sublinhar que valorizar o Cineteatro não significa reconstruí-lo como era, nem travar a evolução.
O que defendo é que não é necessário apagar completamente a sua memória.
A arquitetura tem a capacidade de reinterpretar e transformar, dando novos significados ao que já existiu e criando algo que una passado, presente e futuro.
Assim, não ficamos presos ao que já passou nem caímos na ideia de começar do zero.
Podemos evoluir sem perder identidade.
E é precisamente essa fusão que torna uma cidade mais rica, mais humana e verdadeiramente nossa…”
Diana Bela Novo, Arquiteta